sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Habeas Corpus e liberdades públicas

Tenho visto muita coisa na minha prática jurídica como advogado. Poucas, porém, tão impressionantes como certas decisões judiciais tomadas ao sabor da vontade do magistrado, sem fundamento no ordenamento jurídico. Muitas vezes, subvertendo mesmo o sentido e o alcance dos institutos. Mesmo que em nome das melhores intenções, supondo que elas existam mesmo, não se poderia postegar garantias fundamentais dos cidadãos, invertendo a própria razão de ser dos institutos e remédios jurídicos.

No dia 17/08/2009 fui surpreendido com a notícia de que a ex-prefeita de Estrela de Alagoas, Ângela Garrote, estaria foragida, mesmo depois do relaxamento da sua prisão pela 17ª Vara Criminal da Capital, por determinação do Des. Orlando Manso. Mas o novo decreto de prisão teria sido prolatado em que processo? Aí a razão da minha surpresa: no Habeas Corpus que havíamos impetrado contra aquela primeira decisão, posteriormente revogada pela mesma 17ª Vara. Ora, se houve revogação da prisão, o Habeas Corpus impetrado perdera evidentemente o objeto, certo? Errado, segundo o relator. Para ele, o HC lhe dava jurisdição, tirando da 17ª Vara, que ficaria impedida de soltá-la até que o Tribunal de Justiça se pronunciasse. Eis a notícia retirada do Blog do Ricardo Mota:

17/08/2009
Ângela Garrote é considerada "foragida da Justiça"

A ex-prefeita de Estrela de Alagoas, Ângela Garrote, é considerada foragida da Justiça. Ela teve o pedido de prisão decretada pelo desembargador Orlando Manso - logo depois de liberada pelos juízes da 17ª Vara Criminal da Capital, em 31 de julho -, acusada de tentativa de homicídio, em 2005. A ordem do magistrado foi entregue à direção da Polícia Civil, mas a ex-prefeita não foi mais localizada. Segundo o diretor geral da direção da PC, Marcílio Barenco, ela foi procurada em Estrela de Alagoas, Arapiraca, Campo Grande e Maceió, "mas não foi encontrada nos lugares onde poderia, provavelmente, estar".

Segundo o advogado Adriano Soares, Garrote "não está tecnicamente foragida". Ele explicou que a sua cliente não tem conhecimento do decreto de prisão, "até porque a competência para tal seria da 17ª Vara Criminal, que já atendeu ao nosso pedido de Habeas Corpus. Se houve ordem de prisão do relator do HC foi uma inversão do papel desse remédio jurídico".

Numa palavra: o remédio heróico criado para proteger as liberdades públicas passou, em Alagoas, a servir também para prender! (Esqueçam aqui se o paciente é A, B, C, você ou eu. Interessa a insegurança jurídica a que se submete o direito de ir e vir). Diante disso, impetramos um novo Habeas Corpus, desta vez no STJ. Eis a ementa da decisão do Min. Napoleão Maia Nunes Filho:

  1. Mostra-se teratológica, de modo a justificar a superação excepcional do enunciado 691 do STF, a decisão judicial monocrática de Desembargador do Tribunal de Justiça que em HC determina o recolhimento do paciente à prisão, máxime quando já apresentado pedido de desistência do mandamus, em face da perda do seu objeto, por revogação da prisão preventiva dantes decretada e que motivara a impetração do HC.
  1. O HC é medida de excepcional eficácia que serve única e exclusivamente à tutela da liberdade individual, se ameaçada ou objurgada, por ato ilegal ou abusivo, não se prestando para veicular constrangimento a esse superior bem da personalidade, protegido por norma constitucional de tradicional e respeitável hierarquia.
  1. Ordem concedida.

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