quarta-feira, 31 de março de 2010

Semana Santa

Senhor, eu te amo. Sou pequeno, pecador, com profundas limitações. Muitas vezes, deixo de fazer o bem que quero para fazer o mal que não quero. Outras tantas, termino por fazer o mal que quero, porque sou mesquinho, porque não deixei que o teu amor me tomasse por inteiro, ensinando-me o caminho. Orgulhoso também sou, por vezes. Mas tento não ser, Meu Deus.

Pai, por ser limitado, preciso do Salvador. Por ser pequeno, preciso crer que o Senhor me amou tanto, que foi capaz de dar a vida do seu Filho em sacrifício perfeito por nós. Sim, por isso posso ser feliz, mesmo pecando diante do Senhor: porque o seu amor não tem limites, porque o Senhor me conhece inteiro, porque o Senhor, enfim, sabe tudo sobre mim, sabe o que vai no meu coração.

Meu Senhor e meu Deus, eu o amo. E peço que nesta Semana Santa me ensine a rezar, ensine a ouvir, ensine que a cruz é ponto de partida da salvação, mas é na ressurreição que encontramos o amor consumado, a fé em plenitude, a humanidade em pé, glorificada no e pelo Amor.

Amém!

Pessoal, a Semana Santa é uma ótima oportunidade para uma reflexão sobre o sentido da vida. Cristo ilumina tudo. No mistério da cruz, Ele nos ensina a plenitude do amor, o sentido último da entrega, a preocupação com o outro. Mais ainda: na cruz, Cristo nos aponta para o Reino, para o amor do Pai.

Aproveitemos esses dias para refletirmos sobre o que somos e sobre a nossa vida. A oração que inicia esse post é uma oração que pode ser feita por qualquer pessoa: todos somos pequenos diante de Deus, do seu amor e da sua misericórdia.

Paz!

domingo, 28 de março de 2010

Música de fim de semana: Um dia de domingo

O domingo é um dia especial. Para os que se amam, uma oportunidade de estar juntos, coração no coração. Muitas vezes nós erramos com quem amamos, não somos suficientemente presentes, deixando passar a oportunidade de dizer do amor, da necessidade de estar juntos, de redescobrir o amor, que a cada dia envelhece e se renova. Um domingo suave para todos, com uma música especial e bem interpretada:

sábado, 27 de março de 2010

Bento XVI: uma declaração de amor

Um belo texto de Dom Henrique Soares, bispo auxiliar de Aracaju, sobre o Papa Bento XVI. É um texto lindo de um homem autêntico, em que o o bispo fala sobre o seu amor pelo Papa. Lendo, podemos conhecer pelos olhos de um católico fiel a figura enorme de Joseph Ratinger:

Meu Bento XVI

Nunca escondi meu profundo amor por Joseph Ratzinger. É antigo: desde 1981. Em novembro daquele ano, seminarista em férias, li um texto seu. Lá havia uma frase do então Cardeal Arcebispo de Munique: “Ninguém é maduro de verdade até que tenha enfrentado sua própria solidão!” Meus olhos marejaram (como marejam agora, neste momento). Pensei: quem afirma isto só pode ser um homem de verdade, só pode ser alguém que tem uma profunda experiência de Cristo! Eis aqui um homem de Igreja que continuou homem, com um coração, com sensibilidade, com retidão!

Um ano depois, dei com uma entrevista do Cardeal, agora nomeado Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Ele afirmava: “O primeiro dever do Bispo é defender a fé dos pequenos contra a prepotência de alguns teólogos...” Vibrei de alegria! O homem era realmente católico em cada fibra: sabia que a fé supera a razão e que o Mistério não se apreende em profundidade a não ser de joelhos e bebendo a límpida fé da Mãe Igreja, fé que se manifesta sobretudo nos pequenos, nos simples, no Povo de Deus em seu dia-a-dia.

Ratzinger tornou-se para mim uma referência. Doíam-me tanto as calúnias contra ele, as afirmações de muitos adeptos da Teologia da Libertação, que deformavam a imagem e o pensamento do Cardeal de modo vergonhosamente desonesto. Lembro-me das declarações pervertidas de Leonardo Boff e companhia a respeito do Cardeal Prefeito que, generosamente, ajudara ao próprio Boff nos tempos de estudo na Alemanha... Aqui no Brasil, as editoras católicas o censuravam metodicamente... Se algum seu escrito perdido aparecia, era dos menos expressivos e importantes... A imprensa só falava do Cardeal para criticá-lo, insuflada por certos setores da Igreja no nosso País...

A coisa intensificou-se quando da doença de João Paulo II. Agora era preciso queimar de vez o Cardeal da Inquisição, o Desumano, o Ditador... Foi uma pesada campanha dentro e fora da Igreja, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa... As pessoas nunca leram nada de Ratzinger, mas o antipatizavam de todo o coração. Recordo do conhecido jornalista Alexandre Garcia, que confessou ter comprado livros de Ratzinger e lido seus textos. Tomou um susto: o homem que escrevera aquelas coisas não era nada daquele monstro que diziam... Eis: o preconceito, filho da ignorância e irmão da má-fé!

E veio o Conclave. Aquele que no céu tem o seu trono riu-se dos planos dos homens e zombou dos grandes e sabidos deste mundo. Ratzinger tornou-se Bento XVI! Ouvi entrevistas, vi matérias na imprensa nacional e internacional simplesmente vergonhosas, vi entrevistas de teólogos – recordo de um da PUC de São Paulo à TV alemã – simplesmente revoltantes: mentirosas, desonestas, caluniadoras, sem caridade...

E aí está Bento XVI: amado por seu rebanho e por tantas pessoas de boa vontade, pela gente simples, cristã, de DNA católico; homem profundo, mergulhado em Cristo, nele alicerçado; homem doce e ao mesmo tempo tão firme; homem que não tem medo de proclamar a verdade, sem gritar, sem impor, mas sem jamais escondê-la: mostra-a inteira, límpida, serena, cortante, libertadora!

No tocante à vida moral do clero, menos de um mês antes de ser eleito Papa, na via-sacra do Coliseu, afirmou sem meias palavras, desgostando a muita gente: “E que dizer da terceira queda de Jesus sob o peso da cruz? Pode talvez fazer-nos pensar na queda do homem em geral, no afastamento de muitos de Cristo, caminhando à deriva para um secularismo sem Deus. Mas não deveríamos pensar também em tudo quanto Cristo tem sofrido na sua própria Igreja? Quantas vezes se abusa do Santíssimo Sacramento da sua presença, frequentemente como está vazio e ruim o coração onde Ele entra! Tantas vezes celebramos apenas nós próprios, sem nos darmos conta sequer d’Ele! Quantas vezes se distorce e abusa da sua Palavra! Quão pouca fé existe em tantas teorias, quantas palavras vazias! Quanta sujeira há na Igreja, e precisamente entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer completamente a Ele! Quanta soberba, quanta autossuficiência! Respeitamos tão pouco o sacramento da reconciliação, onde Ele está à nossa espera para nos levantar das nossas quedas! Tudo isto está presente na sua paixão. A traição dos discípulos, a recepção indigna do seu Corpo e do seu Sangue é certamente o maior sofrimento do Redentor, o que Lhe trespassa o coração. Nada mais podemos fazer que dirigir-Lhe, do mais fundo da alma, este grito: Kyrie, eleison – Senhor, salvai-nos (cf. Mt 8, 25)".

Um homem assim não passa despercebido: ou é amado ou profundamente odiado! E há muitos que odeiam este santo e bendito Papa! Foi ele que, logo ao assumir, suspendeu o Padre Marcial Maciel, sacerdote famoso e muito apreciado por João Paulo II (o Papa João Paulo desconfiava muitíssimo de acusações na área de pedofilia, porque os comunistas poloneses utilizavam muitas acusações falsas como modo de desmoralizar o clero polaco. Isto criou em João Paulo II uma tendência a não dar muito crédito às acusações. Sempre que via um padre zeloso ser acusado, a tendência era logo recordar as mentiras dos comunistas poloneses... daí, a lentidão do processo do Pe. Macial. Foi um erro compreensível, mas um erro). Bento XVI não! Suspendeu o Pe. Maciel e determinou que vivesse seu fim de vida de modo recluso e sem contato algum com os fieis, numa vida de oração e penitência. O mesmo com o conhecidíssimo italiano Pe. Luigi (Gino) Burresi. Sua punição foi severíssima. Aos Bispos sempre recomendou tolerância zero com a pedofilia. Em seus pronunciamentos sobre o tema, nunca, Papa algum foi tão direto, claro e radical: na Igreja não há lugar para pedófilos. Os pedófilos devem ser demitidos do estado clerical e os Bispos devem comunicar à justiça comum! Tanto que em seu pontificado os casos de pedofilia desabaram...

Mas, nada disso interessa à imprensa, sobretudo aos jornais anticatólicos como New York Times, La Repubblica, El País, Spiegel... Para estes não interessa a verdade: interessam os fatos distorcidos, as meia verdades que, somadas, dão uma enorme mentira, uma triste difamação, uma calúnia monstruosa... O mesmo fizeram com Pio XII... Qual o objetivo? Desautorizar um Papa incômodo, cuja única preocupação é testemunhar o Cristo com toda a inteireza da fé católica. E nada é tão incômodo e antipático quanto isto! Por isso mesmo, tudo quanto este Papa diga ou faça é distorcido, deformado e, depois, duramente criticado, até ao paroxismo...

Mas, Bento XVI seguirá seu caminho! No meu primeiro encontro com ele como Bispo novo com o Sucessor de Pedro, disse-lhe: “Santo Padre, o Povo de Deus lhe quer bem! Nós rezamos por Vossa Santidade, nós estaremos sempre ao lado de Vossa Santidade!” Ele sorriu aquele sorriso tímido, mas tão humilde e franco e disse: “Obrigado! Muito obrigado! Eu preciso tanto do vosso sustento!” Só quem não o conhece poderia pensar que ele se dobra! Ninguém é tão perigosamente livre, é tão docemente forte quanto o homem que fez de Cristo o seu refúgio, a sua luz, a sua certeza! Bento XVI – santo Bento XVI, bendito Bento XVI! – é assim.

Hoje, 29 anos depois daquele 1981, quando, de coração apertado, imagino a dor e a solidão deste homem de Deus, consolo-me pensando no gigante que ele é e vem-me forte, mansa, decidida, certa, a sua palavra: “Ninguém é maduro de verdade até que tenha enfrentado sua própria solidão!” Bento XVI é maduro, Bento XVI não tem medo da própria solidão, pois ela é toda povoada por Cristo!

Deus o abençoe sempre, Padre Santo! Deus o abençoe e o livre das mãos de seus ferozes e maldosos inimigos!

sexta-feira, 26 de março de 2010

Ainda a questão da pedofilia e do celibato



Sob intensa pressão. Assim está o Papa Bento XVI. As críticas à omissão da Igreja sobre uma tomada de atitude mais enérgica contra os padres acusados de pedofilia pesam agora sobretudo contra o Cardeal Joseph Ratizenger. O The New York Time fez publicar matéria sobre uma suposta omissão do Cardeal quando ainda atuava como bispo na Alemanha (aqui):

"O caso do padre alemão, Peter Hullermann, ganhou nova relevância porque ocorreu na época em que Ratzinger, que posteriormente foi encarregado de lidar em nome do Vaticano com milhares de casos de abuso, estava em posição de encaminhar o padre para ser processado, ou pelo menos impedi-lo de voltar a ter contato com crianças. A Arquidiocese alemã reconheceu que “grandes erros” foram cometidos na forma de lidar com Hullermann, apesar de ter atribuído esses erros a pessoas subalternas de Ratzinger, e não ao próprio cardeal.
...

Bento era conhecido por lidar com os casos de abusos por padres no Vaticano antes de se tornar papa. Apesar de alguns terem criticado seu papel no tratamento desses casos ao longo das últimas duas décadas, ele também foi elogiado pelos defensores das vítimas por levar o assunto mais a sério, pedindo desculpas às vítimas americanas em 2008.

A passagem do futuro papa por Munique, na história mais ampla de sua vida, até agora era vista como apenas um degrau na escada para o Vaticano. Mas este período em sua carreira recentemente passou a sofrer grande escrutínio –particularmente seis semanas decisivas de dezembro de 1979 a fevereiro de 1980.


É preciso cautela. A crítica que se faz ao Papa em 2010 é por uma suposta omissão sua no final dos anos 70 e início dos anos 80, quando a questão da pedofilia não se apresentava como um endemia do mundo moderno, não apenas na intimidade da Igreja. Ali, o líder religioso estava diante de um caso específico, em que se tentava recuperar o religioso dos seus vícios primitivos para que ele pudesse continuar legitimamente no exercício do seu ministério. Julgar a atuação da Diocese de Munique com os critérios e olhos de hoje é uma violação à história e à honestidade intelectual, ainda mais quando se coloca o caso dentro de um largo quadro de casos existentes em outros países, como Dinamarca, Irlanda, Holanda e Estados Unidos.

A pedofilia, insista-se, nada tem a ver como o celibato ou a homossexualidade. Há heterossexuais casados que são pedófilos, muitos deles tendo por vítimas as suas próprias filhas. Há redes de prostituição infantil, de turismo sexual, em que a exploração das crianças e adolescentes é feita por homens heterossexuais casados. Quem não se lembra do famoso e terrível caso do austríaco Josef Fritzl, que manteve a sua filha presa em um porão por 24 anos, tendo abusado sexualmente dela desde a infância, chegando ao absurdo de gerar 6 filhos com ela em todo esse período, frutos da relação incestuosa?


Poderíamos apontar aqui, através de uma pesquisa simples no Google, inúmeros casos escabrosos depedofilia, com verdadeiras redes de prostituição infantil utilizadas por empresários, políticos e toda a sorte de gente.

A crítica que se faz ao Papa Bento XVI é interesseira: muitos buscam deteriorar a legitimidade moral da Igreja em um mundo perdido, sem referência, que encontra nela uma firme âncora para esta nau desgovernada, sobretudo em temas delicados como o aborto, a eutanásia, a bioética, o casamento homossexual...

Que os católicos rezem e continuem a defender a sua fé, que não advém de homens, mas de Nosso Senhor Jesus Cristo, pedra angular da sua Igreja e da nossa fé.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Música: Diz pra mim

Nando Cordel. Um forró apurado, suave, poético. Na adolescência dançávamos muito as suas músicas e as de Jorge de Altinho. Encontrei uma bela música sua, doce como são as poesias bem construídas, as declarações de amor que rasgam o coração. Paula não conhecia essa música: é para ela que publico. O amor permeia a vida, do começo ao fim, e não podemos deixar que o dia a dia cansativo nos faça esquecer de que é sempre bom dizer "te amo".


terça-feira, 23 de março de 2010

Pedofilia e celibato

Um reflexão de Dom Henrique Soares (aqui) sobre a questão do celibato e da pedofilia:

Pedofilia: ponderações

Caro Leitor, em algumas partes do mundo – também no nosso País – têm surgido escândalos provocados por padres pedófilos (há também outros vários escândalos ligados à vida sexual dos sacerdotes). Na Europa, sobretudo, a imprensa e certos ambientes da Igreja ditos progressistas vêm procurando associar esses tristes e inaceitáveis casos ao celibato. Eis algumas ponderações que gostaria de fazer:

1. Há, sim, na Igreja, sacerdotes pedófilos. É triste, é vergonhoso, mas é verdade. Eles não estão nela porque a Igreja os promove e os acolhe... Há sacerdotes pedófilos, como há pastores evangélicos pedófilos, pais de família pedófilos, professores pedófilos, juízes pedófilos, médicos, psicólogos, militares e jornalistas pedófilos... Nem mais nem menos! Aliás, como já acenei neste blog, a grande maioria dos abusos de menores dá-se no recinto do próprio lar. Quando era padre acompanhei muitos desses dramas dolorosos e de difícil resolução... Então, por que aparecem muito mais os casos de padres pedófilos? Por vários motivos. Eis alguns: (1) É muito mais difícil para um sacerdote se esconder, (2) os casos com padres são mais divulgados pelo potencial de escândalo e de atrair atenção, (3) há o contato de muitos padres com jovens coroinhas e jovens educandos nas escolas católicas, (4)em alguns países há uma indústria mafiosa para arrancar dinheiro da Igreja com casos de pedofilia verdadeiros ou forjados...

2. Associar a pedofilia ao celibato é pura má fé! Uma coisa é totalmente independente da outra. Um pedófilo pode mascarar-se por baixo do ministério sacerdotal como pode encapar-se num casamento! E são tantos! O celibato é um dom de Deus para a Igreja e, que fique bem claro: não há nenhuma propensão do Papa e do episcopado de suspender a disciplina atual, que exige o celibato dos sacerdotes! A crise de vocação não é motivada pelo celibato, como também a crise de fidelidade não tem no celibato sua causa! A crise é de fé, não de celibato!

3. É preciso deixar claro o seguinte: o atual processo de secularização, de banalização do sagrado, da redução do sacerdócio a uma profissão e do padre a um fazedor de pastoral - esquecendo a ontologia mesma do sacerdócio, isto é, a essência, o ser mais profundo do padre, que pelo sacramento da Ordem torna-se um homem de Deus, um outro Cristo, um homem inteiramente consagrado “às coisas de Deus” -, é isto, precisamente, que leva ao relaxamento e ao enfraquecimento da vida moral de tantos padres. Há uma tendência, até mesmo em certos setores da Igreja, de ver o padre de modo secularizado, tirando-lhe todo o sentido sagrado e místico. Até na nomenclatura, quantas vezes, em tantos ambientes teologicamente doutros, evita-se chamar o padre de sacerdote para denominar-lhe simplesmente presbítero... é de fé católica e é indispensável recordar: o padre deve ser um homem de Deus, um homem sagrado e consagrado, um homem cujo modo de ser e de viver deve trazer claramente as marcas do Eterno!

4. Nunca esqueçamos: somos pecadores! O padre, como qualquer outro ser humano, é membro de uma humanidade ferida, com falhas, com más tendências, com fraquezas. Os padres são assim, os casados são assim, a humanidade toda é assim! O cristianismo ensina claramente que todos somos marcados pela ferida do pecado original. Não somos certinhos, bonzinhos, cheirosinhos! Somos lavados por Cristo, salvos por Cristo, recuperados, curados pela cruz de Cristo! Não é por acaso e não é jogo de cena que ao início de toda Missa comecemos por bater no peito pedindo perdão. O pecado é uma realidade concreta, forte, próxima, presente na nossa existência. Contra o pecado é necessária a vigilância, a oração, a mortificação, uma profunda adesão ao Senhor. Nunca nos deveríamos assustar com o pecado, mas olhar para o remédio, que é Cristo, e dele fazer uso! Sempre houve padres com más tendências na área sexual-afetiva. Muitos desses conseguiram superar e integrar suas misérias com uma vida espiritual séria e devota. Com a oração, a sincera busca da direção espiritual, a confissão e os demais meios que a Igreja nos oferece para buscar a santidade, é possível ir superando as feridas e quedas e ser um santo sacerdote, um verdadeiro homem de Deus. O padre, o cristão não são uns impecáveis, mas pessoas a caminho no seguimento de Cristo, olhando para ele, nele colocando a esperança, nele procurando o perdão e nele crescendo dia por dia, até o Dia eterno. O problema é que com a secularização e o relativismo atuais, tudo parece permitido, tudo é jogado na conta da misericórdia de Deus, tudo é resolvido psicologicamente! Penso que um dos maiores problemas para uma verdadeira e leal vivência do celibato dos padres é, precisamente, a secularização, isto é, a mundanização, a perda da consciência e dos sinais de uma clara identidade que mostra que o sacerdote é um homem de Deus. Muitos na Igreja alegam que os sinais de uma identidade (no agir, no rezar, no modo de viver, no vestir, no modo de se divertir...) são uma capa para esconder insegurança e vida dupla... Não concordo de modo algum! Há, realmente, aqueles, que se prendem de modo exagerado e patológico a sinais externos, como as vestes eclesiásticas e paramentos, descuidando-se de outros aspectos importantes e até mesmo do cultivo de uma piedade profunda, madura e integrada, de um zelo pastoral verdadeiro, de uma simplicidade de vida, sem ostentações ou luxos e sem excessivas preocupações materiais. Mas, daí, a se afirmar, como é costume hoje em muitos meios da Igreja, que valorizar o sagrado do sacerdócio é sinal e sintoma de hipocrisia, de carreirismo, de exibicionismo, de autoafirmação e mascaramento, é realmente um passo muito comprido e serve somente para justificar o outro extremo: a secularização, a vida sem piedade, uma compreensão do sacerdócio de modo simplesmente humano, funcional e mesmo profissional...

5. Vivemos num mundo complexo, paganizado, em crise de valores... Os jovens que entram no seminário não vêm do céu, mas do mundo. É fácil tirar o menino do “mundo”, mas tirar o “mundo” do menino, como é difícil. Aqui a urgência de uma formação seminarística que dê mística sacerdotal sólida, madura e profunda aos candidatos ao sacerdócio, também a necessidade de conhecer a dinâmica afetiva dos seminaristas. É preciso ter bem claro: um rapaz que não consiga ser casto no celibato não pode, de modo algum, ser padre! Um rapaz com tendências pedófilas tem que ser imediatamente mandado embora do seminário. Do mesmo modo, um sacerdote que se mostra incapaz de viver seu celibato deve ser aconselhado a deixar o exercício do ministério e, no caso de pedofilia, deve ser realmente excluído do exercício do sacerdócio: deve ser demitido do estado clerical. Quanto à tão propalada condescendência de Igreja com padres pedófilos no passado, é bom não esquecer que não se tinha nem de longe ideia da extensão e da gravidade da situação dessas pessoas pedófilas... O problema da pedofilia na sociedade é uma realidade que emergiu há poucas décadas atrás e ainda nos surpreende a todos!

6. É bom também que se saiba que na Igreja há o Direito Canônico: ninguém pode ser condenado sem uma acusação formal, sem ser antes advertido, sem o direito de defender-se. Não é justiça e é contra a caridade promover pura e simplesmente uma caça às bruxas. Como também é pecado grave de omissão por parte da autoridade eclesiástica simplesmente fechar os olhos para os escândalos e delitos dos sacerdotes: é necessário tomar corajosamente as medidas cabíveis!

7. Uma coisa importante: a infidelidade de muitos não pode deixar na sombra a fidelidade heróica e silenciosa de muitos e muitos tantos que, no dia-a-dia, sem aparecer em jornais, dão um esplêndido testemunho de amor a Cristo e aos irmãos. Que ninguém duvide: a grande maioria de nossos padres vive com alegria e amor a Cristo o seu celibato e é digna de todo o respeito e toda a confiança de nossa parte! Os católicos devem ter muito cuidado com uma imprensa em geral anticristã e sensacionalista, preocupada não com a verdade, mas com o escândalo. Quanto já se tentou incriminar o Santo Padre dos mais variados modos! Quanto já se deturpou atitudes e palavras do Papa! Que inferno fizeram os meios de comunicação com o caso da menina do aborto de Alagoinha, em Pernambuco... Até quando seremos ingênuos, achando que os meios de comunicação transmitem a mais pura verdade, sem escusos interesses por trás da notícia?

8. Uma última observação: nos momentos de glória e beleza da vida da Igreja (como, por exemplo, no sepultamento de João Paulo II) é fácil estufar o peito e declarar-se católico. O católico verdadeiro, o verdadeiro filho da Igreja, é aquele que nos momentos de dor e de escândalo, quando a Igreja é apedrejada, chora com sua Mãe católica, crava os olhos em Cristo, reza e permanece fiel. Para este, vale a palavra do Salvador: “Fostes vós que permanecestes comigo em todas as minhas tribulações!” Nunca esqueçamos: o mundo não está preocupado com o bem da Igreja ou das vítimas da pedofilia, mas com o escândalo, o sensacionalismo e a imposição hipócrita do politicamente correto. É só!



Escrito por Dom Henrique às 23h21

domingo, 21 de março de 2010

Incidência, fato jurídico e teorias pré-hermenêuticas

Vi hoje, aqui em Salvador, a justa homenagem a Marcos Bernardes de Mello organizada por Fredie Didier Jr. e Marcos Ehrhardt Jr., publicada pela editora Saraiva sob o título Revisitando a teoria do fato jurídico. Marcos Mello foi meu professor de Teoria Geral do Direito, sendo responsável por formar gerações a partir da obra de Pontes de Miranda. A ele, devo o gosto pelo estudo do pensamento pontensiano, que sempre esteve presente no eixo da minha formação jurídica.

Tive oportunidade de ler com especial interesse dois dos textos que compõem obra: um, escrito por Adrualdo de Lima Catão; outro, por Andreas J. Krell. Em texto interessante, Catão escreveu sobre Uma visão pragmática da noção de fato no direito: o caráter interpretativo do fato jurídico; Krell, doutra banda, tratou com competência sobre A relevância da teoria do fato jurídico no âmbito do moderno direito constitucional e administrativo. Ambos fazem observações relevantes sobre a teoria do fato jurídico através de uma visão pragmática e hermenêutica, respectivamente.

Catão, por outras vias teóricas, aproxima-se da corrente defendida por Paulo de Barros Carvalho segundo a qual "fato" não seria o evento ocorrido no mundo (penso "mundo" aqui no sentido usado por Husserl), mas "nada mais do que descrições feitas por observadores, as quais refletem, desde já, seus interesses e necessidades" (p.2). Daí porque "fato" é sempre algo de subjetivo, sendo "impossível se falar em conhecimento objetivo dos fatos" (idem, ibidem). Para ele, inclusive, seria imprópria a distinção entre mundo dos fatos e mundo jurídico, porque os fatos já seriam sempre produto de uma valoração. Catão afirma: "O problema é quando a postura formalista se transforma numa visão pragmática sobre o fato, deixando de levar em consideração o aspecto interpretativo do fato jurídico. O problema é quando se passa a pensar num `fato puro`, pré-linguístico, fora do jogo de linguagem. É esta noção que dá ensejo à distinção factual-normativo, como se existisse um fato natural, puro; e um fato valorado, que já seria o fato jurídico". E adiante assevera: "O que tradicionalmente se pensa é que o fato puro é independente do homem e não é passível de interpretação. Tampouco o fato jurídico é passível de interpretação, pois seria apenas a ocorrência lógica decorrente do conhecimento humano do fato puro correspondente ao suporte fático abstrato"(p.19).

A tese de que a incidência da norma reclama o conhecimento do fato por alguém não é de Pontes de Miranda; é uma afirmação de Marcos Bernardes de Mello, que confundiu - seja-me permitido afirmá-lo - o mundo do pensamento com o plano da psique, pondo equivocadamente o fenômeno da incidência da norma jurídica na mente de um sujeito psicologizado. Na verdade, o plano da incidência é justamente o mundo intersubjetivo da cultura, das vivências intencionais, a que Karl Popper denominou de mundo 3, o mundo dos pensamentos objetivos.

Como mostrei no meu livro Teoria da incidência da norma jurídica, o evento morte ingressa no direito apenas quando conhecida, porque assim é previsto no ordenamento jurídico; a morte não conhecida é, juridicamente, ausência, com os efeitos jurídicos daí decorrentes.

Interessante observar que Krell considere pré-hermenêutica a teoria da incidência da norma jurídica justamente porque toda aplicação pressupõe uma prévia interpretação, sem levar em conta que a incidência é um fenômeno contrafáctico, como as condições de possibilidade para o entendimento no plano do discurso de cariz habermasiano. A interpretação, talvez esse seja o ponto a merecer uma maior reflexão, não pode ser visto como uma atividade meramente subjetiva, como pensam Catão e Krell, aquele de modo mais forte que este, mas, sim, uma atividade que se dá dentro de um diálogo pressuposto, em que o seu resultado apenas se legitima com a sua vivência intersubjetiva e social.

Escreverei novamente sobre esses temas em um artigo teórico em que procurarei demonstrar que a teoria da incidência que proponho, que é um aggiornamento do pensamento pontesiano, dista muito de ser pré-hermenêutica, nada obstante não se deixe encantar ou levar às últimas consequências o ceticismo antimetafísico do último Heidegger. É disso, ao fim e ao cabo, que se trata: há os que veem a interpretação como um ato meramente subjetivo, entregue à ditadura do sujeito, o que, em última análise, torna impossível o próprio conhecimento. Aliás, não é à-toa que Catão fundamente o seu pensamento no pragmatismo de Rorty e de H. Putnam.

Termino aqui dizendo do meu carinho intelectual aos dois estudiosos alagoanos aqui citados (Krell deixou de ser alemão há muito; é alagoano da gema). Catão é um estudioso jovem e sério, a quem acompanho através do seu blog (e ele acompanha este blog); Krell prefaciou a 2a edição do meu Teoria da incidência da norma jurídica, o que por si só mostra o quanto o prezo. E, por isso mesmo, escreverei sobre o tema com vagar, para entabularmos um salutar diálogo. Vamos em frente.

sábado, 20 de março de 2010

Pedofilia, celibato e fé

A Igreja Católica está sob ataque em razão das sucessivas denúncias contra religiosos em razão de casos de pedofilia? Sim, está. Há setores anticlericais que estão se aproveitando dos graves e inúmeros casos de pedofilia envolvendo religiosos católicos para deteriorar o papel e a importância moral da Igreja no mundo. Bem, apesar disso, não se pode culpar os acusadores pelos erros da própria Igreja, que foi pusilânime com os maus religiosos que usaram o seu hábito e o seu carisma para praticarem abusos sexuais contra crianças e adolescentes. Benevolente com os religiosos, a Igreja foi omissa para com as vítimas, permitindo com a sua omissão que esses religiosos criminosos voltassem a cometer os mesmos delitos.

Alemanha, Holanda, Irlanda são países em que a Igreja tem sofrido de modo mais agudo as consequências da sua tolerância com religiosos pedófilos. Não que a Igreja não visse nessa prática de alguns poucos um delito ou uma grave falta, porém sempre viu com misericórdia e dando ao religioso que caiu em erro a chance de recomeçar. Na prática, terminou por dar a oportunidade para novos abusos, ao invés de afastar das suas funções o religiosos e denunciá-lo às autoridades civis. Pedofilia é crime; e dos mais graves: destrói a infância, tira dos jovens a sexualidade saudável, os valores corretos, a fé verdadeira. O religioso pedófilo pratica um crime mais grave porque alimenta os seus instintos primitivos através da força moral do seu hábito, da autoridade que possui diante da vítima, inclusive de perdoar os pecados...

Como católico, sinto-me envergonhado, tal qual o Papa Bento XVI. A Igreja errou, pecou pela omissão tolerante, mesmo que pelas melhores razões. E está pagando um grave preço por isso, inclusive diante de Deus. Infalível em questões de fé, o Papa pode errar em decisões pessoais, administrativas e políticas. Reconhecer esse grave erro, fazer o mea culpa, adotar uma severa política contra os religiosos pedófilos e colaborar com as autoridades civis são os caminhos que a Igreja está perlustrando, ao lado de uma atenção carinhosa, compreensiva e responsável pelas vítimas dos abusos praticados.

Amo a Igreja de Cristo. Tenho absoluta clareza que o celibato nada tem a ver com a questão da pedofilia. O celibato, a castidade, a ascese, sempre foram, em todas as religiões, meios de aproximação do homem ou mulher a Deus. Já os antigos rezavam: - "Dai-me um coração que seja um!". Sublimar a sexualidade é um ato de amor a Deus, assim como a abstinência de outros apetites: voto de pobreza, voto de silêncio, etc. Abdicar de uma vida sexual ativa, castrar-se pelo amor a Deus, ser eunuco pelo Reino, é entregar-se a aventura do amor integral e da renúncia sofrida, dolorosa, e por isso mesmo renúncia. São Francisco de Assis deitou-se nu sobre uma imaginária mulher feita de neve, diante da força da sua sexualidade e do desejo de se conservar casto e disciplinado para a sua dura missão: viver a pobreza e anunciar o Reino.

“Para defender sua pureza, São Francisco de Assis rolou na neve, São Bento se jogou em um arbusto de espinhos, São Bernardo trancou-se em um depósito gelado. E você, o que fez? Não diga “esse é meu jeito de ser, é meu caráter”. Não! É sua falta de caráter. Seja homem! Quando você decidir firmemente viver uma vida pura, a castidade não será um peso para você, será uma coroa de triunfo”.
São Josemaria Escrivá
É isso. Celibato é coisa para homem, para gente de fibra e de coragem! Pena que alguns se façam padres sem serem homens integrais. Podem ser homossexuais? Até podem. Mas vivendo a homossexualidade casta, cujo afeto é plenamente entregue a Deus. Então, também o problema não está no fato da existência de religiosos homossexuais; está na homossexualidade desenfreada, na entrega dos religiosos aos seus extintos, usando da sua posição privilegiada para ir à cata de jovens objetos sexuais, como passam a ver os jovens que estão aos seus cuidados.

A pedofilia tem sido praticada por heterossexuais casados aos borbotões. A internet está repleta de exemplos de corrupção de menores. O escândalo maior, nada obstante, é quando um religioso é flagrado usando a fé como arma para submeter as suas vítimas. E aí a gravidade do crime pede uma reação duríssima da sociedade e, sobretudo, da Igreja.

Podemos errar. Podemos pecar contra a castidade. Um padre pode se apaixonar por uma pessoa e ser infiel ao celibato, assim como um marido pode não ser fiel à sua esposa e ser infiel à castidade. Estamos no plano privado, em que as conduta serão analisadas à luz da fé. Mas um homem, casado ou religioso, não pode ser pedófilo, não pode abusar da infância e da juventude: além de um grave pecado, comete um crime! E como criminoso deve ser tratado por todos, inclusive e sobretudo pela Igreja.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Vocação e fé

A perda da vocação é terrível para um padre. Porque vocação, fé e vida andam juntas. O homem que perde a vocação, mas conserva a fé, vive um drama profundo, podendo muitas vezes viver dignamente a missão abraçada, mesmo quando já não mais se realiza. Porque vê aquele sofrimento pelas lentes da fé.

O padre que perde a fé, já não mais tem vocação. A vida religiosa passa a ser um um simulacro, um engodo, em que o padre permanece vivendo o sacramento da ordem já agora sem sacramentalidade. Pior: sem fé, sem temor a Deus, usa a sua condição para tentar legitimar as suas transgressões, levando jovens a viverem atos contrários à fé e à Igreja.

O programa Conexão Repórter, do SBT, apresentado por Roberto Cabrini, revelou de modo terrível o envolvimento sexual de padres de Arapiraca com seus acólitos. Ao menos quanto ao Monsenhor Luiz Marques, de 82 anos, a acusação vem comprovada por vídeo de relações sexuais entre ele e um coroinha, que o denuncia (a reportagem pode ser vista aqui; matéria do Uol, aqui).

O mal que estes religiosos causaram a esses meninos e à Igreja não tem tamanho. São homens que perderam a fé, a vocação e a razão. Perderam-se de Deus e se jogaram na satisfação dos instintos. E como é triste ver que perderam o temor de Deus e o amor por ele. Já não viam mais a missa como um memorial sagrado; já não criam mais no milagre do sacramento da ordem; já não eram mais padres...

E por isso transformaram os seus coroinhas em homem-coisa, em objetos para a satisfação da sua homossexualidade descontrolada. Uma pena, enfim!

A vida como ela é: caso de polícia

Possível assalto a banco no Recife. A polícia necessita agir para evitar a atuação de 10 elementos armados. O rádio da conversa entre policiais militares mostra a realidade brasileira. Seria cômico (e olhe que ri muito...) não fosse trágico.

sábado, 13 de março de 2010

This is it

This is it é o filme de Michael Jackson. Os preparativos para os shows que faria em Londres. Mostra um grande artista, a sua genialidade, a relação com a música e com o palco, a dança planejada em cada detalhe, a inquietação em busca dos passos e gestos perfeitos. Doce com os músicos e dançarinos, buscava com eles uma relação próxima, vendendo-lhes o sonho de participarem de uma aventura como se fossem parte de uma família.

Impressionante o seu talento, que escondia nos ensaios a sua angústia, os seus dramas, a necessidade daquela dose cavalar de medicamentos para conseguir dormir. O seu sono era afastado pelo medo de falhar, pela pressão da mídia que o oprimia, pelas constantes notícias falsas sobre a sua capacidade de ensaiar e de cantar; até mesmo a voz - dizia-se - já não era mais a mesma. O mito e as suas necessidades engolira o homem, pequeno diante do peso de ser o artista número um, mesmo em evidente decadência causada por tantos escândalos que a sua figura bizarra incentivava.

Michael Jackson era um grande artista e um pequeno homem. A criança que fora esmagada pelo pai não deixara o adulto se formar; a criança oprimida oprimia agora o homem, acorrentado a um mundo de ilusão, muito bem representado pela neverland, construída em uma fazenda de horrores midiáticos.

O filme mostra o talento daquele artista que afirmavam morto. A morte do homem ironicamente fizera redivivo o artista, o rei do pop. Uma trágica inversão: Michael Jackson foi salvo como mito pela morte do homem angustiado e perdido que se escondia nas franjas da sua fama, do sucesso arrebatador, dos escândalos terríveis, dos processos por pedofilia (cuja inocência declarada judicialmente não salvou a imagem pública). A sensação que tenho hoje, após assistir o filme, é que a sua figura adulterada por tantas cirurgias plásticas servia de atração para toda a sorte de maledicências e fofocas grosseiras. Mesmo sendo uma pessoa doce e afável, conseguiu atrair a ira e a inveja de muitos, que viram em sua estampa esquisita um campo fácil para o ataque e as manchetes fáceis. Afinal, o Rei do Pop gerava notícias e, com elas, muito dinheiro.

Indico o filme a quem interessar. É bom ver as músicas famosas cantadas pela última vez pelo grande artista, os seus cuidados com o show, o envolvimento da equipe, a sua relação afinada com o diretor do espetáculo... Enfim, um documentário bem feito e alegre sobre um homem triste e perdido.

segunda-feira, 8 de março de 2010

BBB 10 e a verdadeira diversidade

Quando estou livre, assisto o Big Brother Brasil. É divertido como entretenimento. Quem quiser programas intelectuais na televisão, há bons canais pagos para isso, como o History, por exemplo, ou mesmo alguns bons programas da Globonews. Na televisão, busco divertimento.

O sucesso do BBB 10 está na diversidade. Juntaram no confinamento um drag queen, um gay jovem assumido e uma lésbica bonita, além de trazerem de volta o ex-BBB Marcelo Dourado, uma pessoa de poucos argumentos, digamos assim. Os outros participantes terminam sendo meros figurantes nesse conflito latente entre os "diferentes", Dourado entre eles. Porque ele também faz parte de uma minoria: trata-se de um cara que tem a suástica tatuada no corpo, embora sem nem ao certo saber o porquê (ou até mesmo sabendo, sabe-se lá), pensando mais com os punhos de lutador.

No mundo do politicamente correto, os homossexuais assumidos poderiam ser tratados como minoria, como pessoas do bem, e o cara da suástica, que declaradamente não gosta de viados, estaria na história como vilão. Mas Dourado conseguiu dobrar a resistência interna em sucessivos paredões, voltando sempre, porque os outros concorrentes suscitaram razões maiores para serem rejeitados pelo público. O público, aliás, não entrou no jogo do politicamente correto, separando de modo maniqueísta os bons e os maus, sendo os gays bons justa e simplesmente por isso, e Dourado o mau apenas por dizer que não gosta de gays ou por ser meio brucutu.

Vozes levantam-se horrorizadas contra Dourado, que quebra a lógica do politicamente correto. No Yahoo lemos a seguinte notícia:

Jean Wyllys criticou Marcelo Dourado em seu blog, no Bloglog. O escritor, vencedor da quinta edição do Big Brother Brasil, publicou texto entitulado "Autoridade dourada e facista" em que afirma que o sucesso do ex-lutador demostra um "apelo misterioso junto às massas", além de ameaçar, de certa forma, os valores tradicionais da sociedade brasileira.

"É como se o fato de o programa abrigar um 'sapatão', uma drag queen e uma 'bicha' andrógina pós-adolescente, bem como uma desinibida dançarina de boate, uma policial militar boquirrota e que se diz sexualmente desenfreada e um judeu editor de pornografia; é como se o fato de o programa abrigar essa fauna diversa ameaçasse os valores morais das audiências heterossexuais e zelosas da família tradicional; como se derrubasse suas certezas e mergulhasse suas vidas interiores num caos".
O coitadismo que tentam impor ao programa é evidente, imaginando que o politicamente correto deva prevalecer até mesmo em um tolo reality show. Dourado encarnaria o preconceito, o mal em estado bruto, devendo ser expurgado por isso. Pura bobagem. Certo que a sua visão de mundo é estreita; mas em que seria mais larga a visão dos demais? Todos ali mostram-se adultos infantilizados, querendo agradar o público e uns aos outros, sem muito de diferente entre eles (é certo que a Fernanda bem que tem aspectos a serem melhor analisados....).

Bem, seja como for, a diversidade do programa a ser comemorada é justamente o casca grossa Marcelo Dourado. Tendo superado vários paredões, o cara já é um vencedor, sendo o realmente diferente em um jogo de iguais.