domingo, 10 de outubro de 2010

Música do fim de semana: Ivete Sangalo

O amor se aprende amando. Nas diferenças, nas dificuldades, no ciúme, no diálogo, na necessidade de outro. O amor conjugal, de homem e mulher, é marcado pela constante tensão na complexidade do querer. Se a tensão se perde, é porque se perdeu a liga que une, que é aquele misto de paixão e medo de perder. Quando não há paixão, apetite, gula, caiu-se na sequidão do cotidiano, no estar por estar, no acomodar-se ao outro. Quando não se tem o medo da perda, é porque o "tanto faz" se instaurou, não havendo razões para a saudade ou para as buscas.

Um casal que não tem momentos de desencontros, de desgastes por amor, é um casal que não tem mais o estímulo de um para o outro, porque o comodismo passou a estabelecer os modos e métodos da relação. Os embates, aqui e ali, ao contrário de demonstrar desencontros, mostra, bastas vezes, o inverso: a ânsia do encontro, as buscas sobre as diferenças, o sangue que pulsa sem se acomodar.

O homem que não olha para a sua mulher com o desejo de sempre, que já não nota os gestos, olhares, andar, cruzar de pernas, não guardou em si a poesia que o fez querê-la, desejá-la e buscá-la.

Amar, amar de verdade, é o litígio de corpos, almas e corações que se querem para além das diferenças e da comodidade.

Por isso, uma linda música do fim de semana.


Encontros de domingos

O papai nos reunia aos domingos. Conversávamos sobre as coisas de casa, sobre os fatos da semana e rezávamos. Ricardo e eu, os mais novos, passamos, com o tempo, a ser objeto de atenção especial. Desde os 8 anos essas conversas eram semanais. Quem eram os nossos coleguinhas, o que conversávamos, quais os palavrões que aprendíamos... E o papai nos ensinava o significado e o porquê de não chamarmos aquelas palavras.

"A Vida Sexual dos Solteiros e Casados", do padre João Mohana, era uma leitura constante. O papai lia e, passo a passo, comentava o que ouvíamos fascinados. "Prepare os seus filhos para o futuro", também de João Mohana, era lido e comentado, mostrando-nos as razões pelas quais éramos admoestados, eventualmente apanhávamos, sempre com o sentido de limites e de responsabilidade.

Lembro-me que o papai usava uma expressão que para mim soava misteriosa, quando tinha 9 ou 10 anos: "Olhe, lá para os 13, 14 anos vocês passarão a sentir o grito do sexo", para o qual desde já ele nos preparava, buscando uma vida equilibrada e ordenada na adolescência. Temas como masturbação, relações sexuais, namoro, amor, eram tratados de uma forma bonita, amena, dentro de uma moral católica.

O papai nos apresentava sempre o binômio amor e sexo. E desde sempre aprendemos que a dissociação entre um e outro, entre homem e mulher, é um desequilíbrio na relação: amor sem sexo é amor de irmãos, de amigos, mas não é o amor de casal; sexo sem amor é o prazer pelo prazer, que só se compreende no vazio dele mesmo.

Lembro-me do papai lendo o livro de Dom Valfredo Tepe, "O sentido da vida", e repetindo a frase que tantas cito como se fosse minha, porque já apropriada em minhas reflexões: "Amor é força unitiva na diferença". O amor como essa relação constante entre um eu e um tu, cuja polaridade não se perde, não se dissolve, em uma relação reflexiva e esvaziada.

Devo àqueles domingos muito do que sou: o gosto pela leitura, pela reflexão sobre ela, o interesse por filosofia e teologia, o estímulo ao diálogo e ao debate, o prazer de uma boa conversa... Meu pai sempre foi um exemplo para mim. Mesmo no que não comungo com ele, mesmo no que não temos identidade, mesmo no que pensamos diferentes. Em tudo, tenho um imenso carinho e respeito, porque "amor é força unitiva na diferença".