sábado, 27 de junho de 2009

Órgãos de controle e burocracia

No Brasil, a fiscalização aos gestores públicos tem crescido muito, mediante uma cobrança crescente da sociedade sobre os órgãos de controle. A União, no governo Lula, deu mais força à Controladoria Geral da União (CGU), que também passou a ser mais um e temido fiscal da reta aplicação das verbas federais. Porém, mesmo com esse excesso de fiscalização, com muitas normas sobre gastos públicos e prestações de contas, o certo é que, sem melhor estudo empírico, nunca antes neste país houve um sentimento tão grande de que a corrupção é uma prática corriqueira na administração pública brasileira.

Quando agora se sabe que o próprio Senado possui uma pretora de atos administrativos secretos, tem-se a exata dimensão do que se pode fazer, mesmo na alta administração pública, para burlar a lei e manter o patrimonialismo no serviço público.

O presidente Lula, nada obstante, critica os órgãos fiscalizadores pela demora da execução das obras públicas. Todo o arsenal de fiscalização construído ao longo de anos, quando o PT estava na oposição e contribuiu decisivamente com as suas denúncias para o início da mudança (aparente) de hábitos, parece agora incomodar o próprio PT no governo (veja o que escrevi sobre os dois PT's aqui). O Brasil não estaria andando em razão da sua burocracia e de uma superestrutura governamental voltada apenas para atrapalhar com a sua excessiva fiscalização. Na Folha de hoje, por Pedro Dias Leite (aqui):

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou ontem a fiscalização sobre as obras e ações do governo no Brasil, por considerá-la excessiva, e afirmou que “esse país foi construído para não funcionar”.
No que ele próprio classificou de “desabafo”, o presidente afirmou que “a máquina de fiscalização é muito mais eficiente que a máquina de execução”: “É só ver quanto é que ganha um engenheiro do Dnit para fazer uma estrada e quanto é que ganha um auditor do Tribunal de Contas para fiscalizar a estrada que o engenheiro vai fazer”, disse ele.
A remuneração inicial de um auditor do TCU é de cerca de R$ 12.000. O salário inicial de um engenheiro do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) é de R$ 4.270.
O discurso faz parte de uma campanha do governo nos bastidores para redefinir a forma de atuação do Tribunal de Contas da União, tido como principal agente de fiscalização do Executivo. No ano passado, o tribunal fez uso de 124 medidas cautelares, por meio das quais suspende licitações e bloqueia repasses para obras com irregularidades graves. Por meio delas, o órgão calcula que evitou prejuízo de R$ 1,7 bilhão.
Lula culpou “a teoria do Estado mínimo, de que era preciso privatizar tudo, de que a Petrobras e a Vale do Rio Doce não valiam nada” pelo “desmonte” do Estado.
A fala presidencial tem um contexto relevante: as obras do PAC estão empacadas. Em parte, por falhas nos processos de licitação ou nas execuções das obras, com a verificação pelo TCU de sobrepreço ilegal. Para Lula, em sua lógica de avançar os cronogramas das obras, a culpa é da fiscalização, cuja função seria apenas burocratizar e atrapalhar o Poder Executivo. Haveria duas categorias de servidores públicos: os que fazem e ganham mal, e os que não fazem, atrapalham e ganham muito bem. Aqueles são os do Poder Executivo; esses, dos órgãos de fiscalização.

Se bem observarmos, porém, veremos que a atual postura do TCU decorre dos constantes questionamentos sobre a sua própria razão de existir: para que serve um órgão responsável pela fiscalização que nada fiscaliza, que apenas trata dos graves casos de corrupção quando eles ganham proporções midiáticas? Cumprir a sua função passou a ser uma necessidade fundamental dos órgãos de fiscalização, sempre mal vistos e mal avaliados pela opinião pública como órgãos priveligiados e sem papel sério a cumprir.

A crítica do presidente Lula é a crítica de quem está no governo. É legítima, portanto. Mas é bom lembrar que o PT da oposição não dispensa o denuncismo e a crítica aos órgãos de controle pela sua leniência com os seus adversários no poder. Seja como for, eis a lição final do nosso presidente da República sobre o denuncismo:
"Não critico a imprensa por conta do Senado. É pelo denuncismo desvairado que às vezes não tem retorno. Há uma prevalência da desgraça sobre as coisas boas. (...) A nação precisa de boas notícias, de autoestima para poder vencer esse embate com a crise internacional", disse.
Aquela prática de um certo partido agora é severamente criticada. O tempo (ou o poder) parace ser mesmo o senhor da razão...

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