Na boca há de haver um sorriso doce, a expressão perfeita do acolhimento. Se carnes a mais houver, que haja. E o molhado do beijo é fundamental, para que tudo se misture numa harmoniosa troca de líquidos e línguas. E que, sendo assim, não faltem os suspiros fundos, a emoção incontida, o bater descompassado do coração, o ferver do sangue, ao ponto limite do ataque cardíaco.
Que os olhos se encontrem e se falem sem palavras. Que se digam tudo, numa obscena invasão da alma, quase se apropriando dos pudores e vergonhas alheias, numa troca profunda dos recônditos labirintos do eu. E desse olhar penetrante, que haja a desventura do perder-se no achar-se noutra alma, e que tudo seja assim, como se nada fosse fora daquele instante único.
Os gestos com as mãos devem falar também. Não tanto pelo atrevimento, mas pela expressão sincera de um querer que não se esconde de si mesmo, revelada na ansiedade de uma fome descontrolada. Mãos suaves que se deixam soltas à procura de um destino onde repouse o desvelar da sua emoção. Se não vão por si mesmas, fingem-se alheias e se deixam encaminhar.
O cruzar de pernas é fundamental. Feminino, o gesto já revela toda uma sensualidade, em liturgia perfeita e ortodoxa. É toda uma odisséia o pousar uma perna sobre a outra, como quem se prepara para acomodar um violão a ser dedilhado em notas docemente declinadas. Tão instigante quanto esse movimento, apenas o consequente gesto inverso, numa atitude cuidadosa de convite a um momento mais delicado.
E, finalmente, a entrega. Que não haja regras, nem manual de instrução nem tampouco normas heterônimas de comportamento. Se houver etiqueta, que seja pouca, porque em demasia não se chega ao estado de ebolição, quando não mais se racionalizam os gestos. O amor muito educado é como vinho em que se despejou água: tirou-lhe o sabor, a força e a tonalidade.
E que tudo seja assim: uma perfeita harmonia de quereres, em que o certo seja o permitido e buscado, entre olhares, mãos, pernas e coração. E o final seja a fadiga plena, o olhar cúmplice e um novo começar, até que esmagados de tantos recomeços, haja o silêncio das onomatopéias e possam, enfim, repousar do amor consumado.
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