segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Paralelas

Linhas paralelas se tocam em algum ponto do tempo ou espaço? Na geometria euclidiana essa operação é impossível; destruiria o próprio conceito. Matematicamente, as paralelas vão ao infinito. Não há possibilidade do toque, da perda de rumo, como fossem linhas de trem, construídas exatamente para serem uma para a outra companheiras do desencontro.

Mas na geometria da vida as linhas, mesmo quando paralelas, terminam tendo um ponto de confluência: às vezes, o acaso; por vezes, um olhar; vezes bastas, uma palavra; outras tantas, um gesto qualquer. E o que era para ser um infinito desencontro transforma-se em uma inversão na lógica euclidiana: as linhas se tocam, se invadem nos espaços e no correr do adiante.

Almas que se encontram são como linhas paralelas que desafiam o destino, a história, o "script", a receita de bolo pronta e acabada. Desafiam, sim, porque negam-se a ler páginas escritas previamente, roteiros traçados por se-sabe-lá-quem, que com com régua e esquadro desenha o caminho ou, lápis à mão, bosqueja uma crônica antecipada do que devemos ser.

O amor é o elemento que destrói a geometria perfeita da vida predisposta e, em um giro sobre si mesmo, redesenha linhas em descompasso e reconstrói novas realidades. É ele essa revolução que esmiuça e desqualifica todos os postulados, rompendo os vincos precisos dos paradigmas, mostrando que a nossa racionalidade simplesmente se rende àquilo que está além mesmo da própria linguagem, do plano da expressão: amar é dizer - de si mesmo e do outro - sem a posse das palavras e para além dos próprios pensamentos! É sentir o sentimento; é assumir o outro antes mesmo do cogito, do "eu penso".

O amor invade a cidadela da razão. Toma-lhe as terras, derruba as fronteiras, se apodera dos seus despojos e faz escravo, como diria o poeta, o vencedor! Amar é ganhar para perder-se, consoante Camões proclamara ainda nos tempos das caravelas. E não sem razão. Não sem olhar para o Sr. El Rey, o amor, e lançar, sem medidas, as velas ao mar da vida.

Há revolução no amor. Quem não sentiu a vida mudar ao ser tomado por ele, quem não sentiu o coração espicaçado em mil pedaços, quem não sentiu a perda do senhorio sobre os próprios sentimentos, não viveu a experiência do amor. Pode ter gostado, pode ter nutrido um sentimento bom por alguém, pode até ter se enamorado, mas não viveu a experiência daquilo que os poetas proclamaram desde sempre, quando o homem começou a se entender e brincar com as palavras. E se você - sim, você que me lê! - não viveu nada disso, a vida lhe roubou a maior das experiências, deixando-o longe do abismo, é certo, mas sem a emoção que ele proporciona.

Porém, que viveu essa densa tempestade, não adianta fugir dela. Ele, o amor, não abandona quem o descobriu comendo-lhe as entranhas da alma. A fuga é o salto no vazio da autonegação. Se o amor não é correspondido com a mesma intensidade e força, o único modo de sobreviver a ele não é negá-lo, é simplesmente deixá-lo vivente, lá em quarto escuro do coração, privado de água e pão, até que, moribundo, não tenha forças para ferir a alma, embora subsista vivo, ali onde não pode gritar para ser ouvido. Mas, nesse caso, nunca deixe que os olhos vejam a pessoa amada: a masmorra em que o amor foi aprisionado poderá não existir à experiência e viver dias de Bastilha.

O amor, finalmente, é a mais bruta força da natureza. Morre-se por amor, agiganta-se por amor, faz-se guerras por amor. Reinos caíram em razão dele, reis abdicaram, plebeus viraram príncipes, obras de arte foram compostas, monumentos erguidos. Em seu nome, a história da humanidade foi escrita e reescrita. Tudo pelo amor humano, amor de homem e mulher. Por ele, as paralelas se curvam e se perdem no enlace do infinito!

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