quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Feliz Ano Novo - 2010

Feliz ano novo a todos. Que Deus nos cubra de graças e nos conceda os dons da fé, da caridade e da esperança. Que 2010 seja um ano de realizações pessoais e profissionais, rico em saúde, felicidade e muito amor. São os votos de Ana Paula, Maria Eduarda e meus.

Receita de Ano Novo

Carlos Drummond de Andrade
In: “Discurso de primavera e algumas sombras”, 1977

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).

Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Tempo

Carlos Drummond de Andrade

Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança
fazendo-a funcionar no limite da exaustão.

Doze meses dão para qualquer ser humano
se cansar e entregar os pontos.

Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez
com outro número e outra vontade de acreditar
que daqui para adiante vai ser diferente…

…Para você,
Desejo o sonho realizado.
O amor esperado.
A esperança renovada.

Para você,
Desejo todas as cores desta vida.
Todas as alegrias que puder sorrir.
Todas as músicas que puder emocionar.

Para você neste novo ano,
Desejo que os amigos sejam mais cúmplices,
Que sua família esteja mais unida,
Que sua vida seja mais bem vivida.

Gostaria de lhe desejar tantas coisas.
Mas nada seria suficiente…

Então, desejo apenas que você tenha muitos desejos.
Desejos grandes e que eles possam te mover a cada minuto,
ao rumo da sua FELICIDADE!!!

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Papa Bento XVI sofre queda após incidente na missa do galo

Ainda bem que nada ocorreu, mas o fato serviu para demonstrar a necessidade de melhorar a segurança no Vaticano. Poderíamos ter vivido uma dolorosa noite de Natal com um atentado a Bento XVI. Um homem de 82 anos de idade levar uma queda como a que ele levou é sempre muito perigoso.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Natal!

Poucas cenas revelam de modo tão dramático e ao mesmo tempo poético o projeto salvífico de Cristo do que aquela construída por Mel Gibson no filme a Paixão de Cristo. Ele nasceu desde o princípio como contradição: sendo Deus, fez-se homem; sendo homem, fez-se pobre; sendo pobre, fez-se humilhado ao nascer em uma estribaria. Esvaziou-se como Deus; esvaziou-se como homem.

Bento XVI adverte que o Natal não é um conto para crianças. Não se trata de aflorar um espírito de natal flor de laranja, mas de refletir sobre o nosso drama humano e a esperança que brota do amor de Deus, na figura daquele menino frágil deitado na manjedoura: “Hoje, como nos tempos de Jesus, o Natal não é um conto para crianças, mas a resposta de Deus ao drama da humanidade em busca da paz verdadeira”, afirma o nosso Papa.

O espírito de natal, citado por muitos, é aquele sentimento difuso, uma saudade não clara da pátria trinitária, escondida sob tantas formas e razões. É uma melancolia de algo que não se sabe o que; é uma felicidade com exceções reservadas, com medos escondidos, às portas de um precipício e de um enorme vazio. Por isso, nos atolamos em presentes, em confraternizações muitas vezes sem significado. E o universo humano pede sempre o sentido das coisas. O que nos move são as finalidades...

O sentido da nossa alegria no Natal - é assim para os cristãos - é o nascimento da criança, da esperança que ela inspira, da certeza inarredável do amor de Deus. É a certeza que somos pobres, limitados, frágeis, mas também de que tudo se dispersa na fortaleza que ele nos traz: o menino nasceu! A Esperança está entre nós! O Amor vive! Ele refaz a crianção e a redime para o Pai. O Natal é momento de algria por isso: renascemos com aquela criança, podemos recomeçar com a certeza de que ela nos ama tanto que veio a nós nos lavar com as suas lágrimas no parto e nos iluminar com o seu sorriso ao ser amamentado no seio da mãe.

Transconstitucionalismo e sociedade policêntrica

O novo livro de Marcelo Neves, com o qual concorreu à titularidade da cadeira de Direito Constitucional da USP, tem um instigante título: "Transconstitucionalismo", editado pela Martins Fontes. A obra possui bibliografia densa, vasta, tendo sido o produto de longa reflexão do autor, estribada em pesquisas feitas na Alemanha, através de bolsas de estudo que possibilitaram o intercâmbio científico.

Marcelo Neves é um pensador brasileiro profundo, cujas obras jurídicas não são daquelas lidas de um fôlego, tampouco com apelo a questões da praxis jurídica. Não. O seu caminho como estudioso é feito por terreno sólido, porém árido, sempre desafiando compromisso sério de quem se proponha a percorrê-lo. É daqueles estudiosos que horam a tradição da Faculdade de Direito do Recife, onde lecionou e iniciou a sua carreira acadêmica.

Voltando ao livro citado, Neves se propõe a estudar o fenômeno daquilo que posso chamar de cultura constitucional, hoje em moda, seja pelo fortalecimento do sentimento nacional, de um lado (de que são exemplos os movimentos separatistas de povos como Montenegro, além de tantos outros casos nos últimos 15 anos), seja pelo movimento contrastante, de outro lado, da necessidade de formação de blocos de países, gerando comunidades transnacionais, como se dá de modo saliente na Comunidade Europeia. De modo que temos Constituições nacionais, supranacionais, transnacionais, comunais, etc. A tal ponto, aliás, que já não se sabe ao certo nem mais o que é Constituição, acaso comparado o conceito com aquele clássico, forjado no início do constitucionalismo.

Fazendo uma ligação com o post anterior, percebe-se em Neves a necessidade de situar o tema central do seu livro justamente na realidade histórica que até mesmo o justifica: o fato de ser a sociedade moderna multicêntrica, sem um eixo em que se movam os seus diversos atores, individuais ou coletivos. É nessa sociedade destituída de um núcleo duro conceitual, que funcione como eixo de calibração ético, filosófico, religioso, etc., que ganha imenso relevo a Constituição como um ponto de equilíbrio e condição de possibilidade da vivência em sociedade. Nas palavras de Neves:
"O constitucionalismo relaciona-se com transformações estruturais que engendraram as bases para o surgimento da sociedade moderna. O incremento da complexidade social levou ao impasse da formação social diferenciada hierarquicamente da pré-modernidade, fazendo emergir a pretensão crescente de autonomia das esferas de comunicação, em termos de sistemas diferenciados funcionalmente na sociedade moderna. Há não só um desintricamento de lei, poder e saber, nem apenas a obtenção da liberdade religiosa e econômica pelo homem, mas um amplo processo de diferenciação sistêmico-funcional.
Mediante esse processo, a sociedade tornan-se 'multicêntrica' ou 'policontextual'. Isso significa, em primeiro lugar, que a diferença entre sistema e ambiente, desenvolve-se em diversos âmbitos de comunicação, de tal maneira que se afirmam distintas pretensões contrapostas de autonômia sistêmica. E, em segundo lugar, na medida em que toda diferença se torna 'centro do mundo', a policontexturalidade implica uma pluralidade de autodescrições da sociedade, levando à formação de diversas racionalidades parciais conflitantes. Falta, então, uma diferença última, suprema, que possa impor-se contra todas as outras diferenças. Ou seja, não há um centro da sociedade que possa ter uma posição privilegiada para sua observação e descrição; não há um sistema ou mecanismo social a partir do qual todos os outros possam ser compreendidos." (pp.23-24).
Nessa sociedade multicêntrica, surge uma racionalidade transversal que permite uma comunicação entre os diversos sistemas sociais, através de acoplamentos estruturais, na linha do pensamento de Luhmann, estabelecendo mecanismos de interpenetrações concentradas e duradouras (p.37). É dentro dessa racionalidade que se pode falar em Constituição transversal, cuja função de unir a diversidade dentro de um mesmo sistema social prepondera, e em Transconstitucionalismo, cuja tônica estar em pôr em diálogo diferentes sistemas constitucionais, buscando pontos de apoio comum na superação das disfunções dentro de cada sistema. Esses dois temas são tratados, respectivamente, nos capítulos 02 e 03 da obra.

Sem ir mais além quanto ao ponto, senão para indicar a leitura do livro de Marcelo Neves, faço uma observação quanto àquele debate entre D'Acais e Habermas. Em uma sociedade multicêntrica, a exclusão da religião da esfera pública é um abuso não apenas discursivo, mas também ideológico, tomando de antemão como irracional qualquer discurso religioso, numa tentativa clara de impor uma visão ateia do mundo, desprendida dos valores religiosos. Nesse particular, Habermas tem muito a ensinar sobre levar a sério um visão democrática da construção de uma sociedade plural e estruturada no diálogo. E é justamente nas Constituições ocidentais que o filósofo alemão busca uma das suas justificativas para a validade do discurso religioso na esfera pública. Vou mais além: também na esfera institucional.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Estado e fé: Habermas e D'Arcais

 HÁ um debate interessante - que eu gostaria muito de resenhar aqui (e o farei, se tiver tempo) - entre o alemão Jürgen Habermas, o maior filósofo do último quartel do século XX, e o italiano Paolo Flores D'Arcais, que no Brasil teve recentemente publicado em livro ("Deus existe?", editora Planeta) o seu diálogo público com o então Cardeal Joseph Ratinzeger (Papa Bento XVI).

Habermas e Flores D'Arcais debateram sobre um tema muito importante atualmente no ocidente, justamente quando assomam em relevo questões bioéticas (como as pesquisas com células troncos, o aborto, etc.), morais (casamento entre homossexuais, adoção de crianças por casal gay, etc.), em que há uma sensível intersecção entre fé e razão, religião e Estado. O filósofo alemão sustenta a existência de duas esferas autônomas de discurso nas sociedades complexas democráticas: a esfera institucional, formada pelos órgãos do Estado chamados a procedimentalmente se pronunciarem e decidirem sobre esses temas de interesse coletivo (parlamento, judiciário, etc.), e a esfera pública, formada pela sociedade civil organizada, pelo debate entre iguais no convívio social e partilhado, é dizer, onde cidadãos podem participar informalmente do debate, como internet, televisão, jornais, manifestações em igrejas e templos.

Para Habermas, na esfera institucional não se admitiria a imissão de discursos religiosos na formação dos argumentos que sustentem uma afirmação, porque sendo laico o Estado, não poderia a religião interferir no processo decisório. Deste modo, não se poderia no processo de uma tomada de decisão do parlamento, de órgãos administrativos ou de tribunais, surgir na articulação de argumentos nenhuma menção a teses de natureza religiosa, como, por exemplo, criticar o aborto com a alegação de que o feto ou embrião seria, à luz da fé, imagem de Deus, tendo pois já a infusão da alma desde a concepção.

Flores D'Arcais resume o pensamento de Habermas da seguinte maneira (aqui):
"...nell’intero orizzonte istituzionale «cittadini [religiosi] e organizzazioni [religiose] devono sapere che il contenuto cognitivo dei loro contributi può giustificare decisioni politicamente vincolanti solo a patto di venire preventivamente tradotto», cioè rigorosamente privato di riferimenti alla fede e a Dio. Insomma, nel processo deliberativo della legge e in quello della sua applicazione l’argomento-Dio deve essere ostracizzato. Nella sfera pubblica, al contrario, che comprende tutti i luoghi della discussione informale (in primis la tv), i credenti hanno non solo il diritto di utilizzare il linguaggio di Dio e gli argomenti della fede, ma ciò facendo apportano alla democrazia una ricchezza irrinunciabile."
E a crítica que faz parte justamente do ponto de vista de um italiano ateu, como ele se define, que vive em país sabidamente católico, em que as relações entre Estado e Igreja são notórias. D'Arcais simplesmente critica o pensamento de Habermas porque, como ateu e membro de uma sociedade civil "libertária", não pode admitir qualquer interferência do discurso religioso no campo institucional, porque a tradução proposta por Habermas seria simplesmente impossível. Como imaginar um dever do discurso institucional apenas admitir argumentos de sabor confessional se houver uma prévia tradução para argumentos, digamos assim, seculares, quando de antemão a religião toma o aborto como infanticídio e, praticado em massa, como genocídio? Ironicamente afirma:
"E poiché gli aborti si contano per milioni, saremmo di fronte a un olocausto esponenziale. La donna, il medico, l’infermiere, sarebbero moralmente assimilabili alla SS che getta il bambino ebreo nel forno crematorio. Tutto ciò segue logicamente dall’assunto religioso ricordato (e nella sfera pubblica è stato infatti puntualmente agitato dagli ultimi due papi, in circostanze anche emotivamente cruciali: viaggio in Polonia, visita ad Auschwitz)."
Para Flores D'Arcais, portanto, a tese habermasiana das duas esferas, pública e institucional, esconderia na prática um cavalo de tróia, porque traria implícita a adminissibilidade de aceitação do discurso religioso como legítimo em uma sociedade plural como a nossa. Noutras falas, traria um perigosa admissão de que a religião, digamos assim, não seria um assunto apenas privado, mas teria relevo público. É isso, sem o dizer, que o filósofo italiano tanto teme, sobretudo após a insistente tentativa de muitos pensadores e cientistas em circunscrever a questão religiosa ao âmbito privado, apenas.

D'Arcais é duríssimo com Habermas justamente por permitir essa fissura entre aquelas duas esferas, que terminaria por legitimar o discurso religioso na esfera pública, o que implicaria, na visão do italiano, em permitir a sua influência, por via oblíqua, na esfera institucional, mesmo porque seria impossível para ele a tradução em termos seculares da condição humana de criatura de Deus:
"Questa radicale separazione della vita politica in due sfere, governate da criteri opposti quanto all’ammissibilità degli argomenti, risulta perciò in primo luogo fattualmente impossibile. In ogni perorazione parlamentare favorevole a punire penalmente l’aborto, risuonerebbe comunque in filigrana l’eco dell’anatema religioso («sacralità della Vita»), che costituirebbe il contenuto evidente, anche se taciuto, dell’argomentazione, e con ciò verrebbero di fatto riunificate le due sfere.
(...)
Di più: se, con Habermas, si incoraggia nella sfera pubblica l’uso di argomenti religiosi anche non traducibili (come, per sua stessa ammissione, è la «creaturalità»), ciò influenzerà quel «franoso sedimento geologico» che è «la cultura politica liberale», i cui elementi «slittano continuamente, dal momento che essa è ricettiva agli impulsi della comunicazione pubblica». E precisamente nella direzione di legittimare progressivamente – per effetti cumulativi – il ricorso all’argomento-Dio in tutto il processo deliberativo, avendolo reso «ovvio» dapprima nell’orizzonte esistenziale. La ragionevolezza del divieto di esso in sede parlamentare diventerà via via più ostica e infine incomprensibile al senso comune, che avverte come si tratti sempre della stessa posta in gioco, ne discutano i parlamentari per deliberare la legge o ne abbiano discusso i cittadini per scegliere chi dovrà deliberare." (O negrito é meu).
Na resposta dada por Habermas, ele faz uma distinção entre o que seria "secular" do que seria "securalístico", tendo o neologismo o sentido preciso de separar uma visão agnóstica sobre a pretensão de verdade do discurso religioso de uma visão militante contra a própria possibilidade de um discurso religioso. Afirma ele:
"Sul piano storico, non è certo un caso che nei paesi europei a monocultura cattolica sia nato un secolarismo particolarmente battagliero. Ma i miei amici secolaristici non mi devono subito obiettare che – lungi dall’espellere la religione dalla sfera pubblica – essi intendono soltanto restringerla al normale ambito giuridico stabilito dalla Costituzione. Giacché, in tal caso, essi dovrebbero anche guardarsi dallo scambiare il secolarismo della Costituzione con la pretesa di secolarizzare la società. Insomma, dovrebbero imparare a distinguere nettamente «secolare» da «secolaristico». Le persone secolari e non credenti hanno un atteggiamento agnostico verso le pretese religiose, laddove le persone secolaristiche hanno un atteggiamento polemico verso l’influenza pubblica delle dottrine religiose. Essi screditano le dottrine di fede in quanto scientificamente infondate. Nel mondo anglosassone, il secolarismo si appella oggi a un naturalismo hard, che restringe alle scienze della natura il monopolio del sapere socialmente valido. Io ritengo che questo scientismo sia una pura Weltanschauung ideologica. Esso è inconciliabile con un pensiero post-metafisico che subordini – senza cancellare il confine tra scienza e fede – anche le questioni morali, etiche ed estetiche alla forza discorsiva di una ragione tanto secolare quanto non mutilata."
Aqui, Habermas fere o ponto central da questão: os militantes de uma visão dita progressista visam sempre solapar a legitimidade do discurso religioso, buscando destruir a sua validade torética, de um lado, e, de outra banda, existenciária ("Heidegger distingue bem existenzial de existenziell. Existenziell, traduzido como existenciário, indica o Dasein visto do ponto de vista ôntico: trata-se de toda remissão do Dasein singular e concreto em seu ser, condicionado e ontologicamente motivado pelo seu caráter existencial", ensina Paulo Afonso de Araújo). Amputar do ser-aí mundano a vivência religiosa, a sua natureza pública, é um sonho de consumo de muitos que tentam amputar a religião dos debates centrais sobre bioética, por exemplo. Porque sendo uma questão meramente privada, de foro íntimo, estaria fora do fundamento dos debates públicos e, inclusive, institucional, como aliás se observou na análise que o Supremo Tribunal Federal brasileiro foi chamado a fazer sobre a constitucionalidade ou não da manipulação de embriões para obtenção de células-tronco.

Finalizo aqui essas observações, chamando a atenção para para o caráter público da religião. Religião vive-se em comunidade; a fé não é uma força vital solitária. Ela, quanto mais vivida, mas necessita do diálogo, da experiência dos outros, de tomada de posições práticas. E é isso que a militância agnóstica de esquerda ou de direita visam: retirar a religião do espaço público, porque ela é uma forte argamassa social.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Música do fim de semana: Runaway

A música do fim de semana é do grupo irlandês The Corrs, formado por quatro irmãos. Com um ritmo leve, fizeram muito sucesso desde as Olimpíadas de Atlanta (1996), quando cantaram ao lado de Celine Dion. A seguir, uma música linda e doce: Runaway. Vale a pena ouvir e deixar a melodia tocar o coração. Quem me apresentou o grupo e a música foi o meu irmão Ricardo.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Evolução humana?

Uma das teses do espiritismo, fundada na lei do carma, é a evolução dos seres vivos (daqui e doutros planetas). Todos evoluimos e, neste processo, purgamos os nossos erros em sucessivas vidas de aprendizado: o sofrimento de hoje seria produto dos erros de vidas passadas, de modo que pagamos elevado tributo nesse processo de crescimento espiritual (quem quiser ter uma visão sobre o espiritismo, com um enfoque para católicos, leia aqui).

Há espíritas que, fortes nessa visão da lei do carma (cuja origem positivista, com apego e decalque das leis de Newton não podem ser negadas, sequer historicamente), compreendem também que houve uma evolução cósmica do gênero humano, citando como exemplo a evolução tecnológica, as viagens espaciais, o desenvolvimento cultural dos povos, etc. Porém, é inegável que o mesmo homem que é capaz de pesquisar com sucesso o solo de Marte, descobrir água na Lua, criar aparelhos com o iPhone, é também capaz da tentativa de genocídio dos judeus em campos de concentração, de criar armas de destruição em massa, de alienar um povo inteiro e submetê-lo à miséria (como na Coreia do Norte), além de condutas individuais terríveis do ponto de vista da própria cultura em que vivemos situados.

A evolução ética, ao contrário da evolução tecnológica ou científica, é um conceito complexo, cuja própria possibilidade é questionada por pensadores através dos tempos. Quem muito bem resenha a questão e reflete sobre ela é o economista Eduardo Gianetti, na obra "Vícios privados, benefícios públicos?", da editora Companhia das Letras, obra que merece ser lida.

Penso que não existe evolução ética. Evolução pressupõe um movimento para cima, progressivo. O ponto alto da nossa evolução - do ponto de vista cristão e admitida que ela, a evolução, existisse - seria a encarnação do Verbo, quando Deus se faz carne e entra na História. É dizer, o centro da História e o ápice do gênero humano seria a humanização do divino por Cristo.

Escrevo essas linhas porque, com a facilidade de informação em tempo real, a cada dia assistimos coisas surpreendentes, que demonstram como a nossa sociedade, o bicho homem, consegue cair rente à sua natureza animal, decaída, vergada pelo pecado. O vídeo abaixo mostra uma notícia absurda, porém muito comum nos dias de hoje: abusos sexuais de filhas por pais e mães. Parece-me o mais baixo que podemos chegar como pais e mães, como pessoas. Assistam:

Venerável

Uma notícia doce para o Natal do Senhor: João Paulo II foi declarado venerável (aqui). Santo subito!, como pediam os italianos e os católicos do mundo:

O papa Bento XVI proclamou neste sábado como «venerável» João Paulo II, após aprovar o decreto pelo qual são reconhecidas as «virtudes heróicas do servo de Deus» Karol Wojtyla. Trata-se do primeiro passo em direcção à santidade.

O decreto foi aprovado durante a audiência concedida no Vaticano pelo prefeito regional da Congregação para a Causa dos Santos, o arcebispo Angelo Amato, embora não signifique a imediata beatificação de Karol Wojtyla, já que ainda falta a aprovação por Bento XVI do milagre que leve à proclamação de seu antecessor como beato.

Fim do ano judiciário

Semanas duras. Semana particurlamente difícil. Justiça entrando em recesso, trabalho demasiado, mas ótimos resultados, ao menos. Parar, agora. Depois de dois anos sem férias, hora de parar. Parar para descansar, para curtir a família, para brincar, ler bons livros, navegar na internet sem preocupações que não deixar a mente desocupada de problemas.

Olho para o ano que está terminando e posso dizer: foi um ano bom! Duro, cheio de batalhas enormes, mas muito positivo. De modo que o descanso será merecido, preparando o corpo e a mente para um ano com novos desafios: 2010. Ano de eleições, ano de lançamento da 9ª edição das minhas Instituições de direito eleitoral, ano de - quem sabe!? - mais um novo livro... Vamos ver, porque as condições de possibilidade são boas.

Até lá, sol, mar, piscina, cervejinha gelada e a família...

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Viagem

Viagem. A distância de casa, mesmo para quem está sempre viajando, é a experiência de estar fora do "nosso"mundo, do espaço em que somos, que é uma extensão da nossa própria personalidade. Ontem, por exemplo, estava eu fazendo uma sustentação oral no Tribunal Superior Eleitoral e a minha filha de 03 anos, assistindo-a pela TV Justiça, tentava falar comigo e propunha à mãe entrarem juntas na televisão: - "Está pronta, mamãe? Vamos para dentro da televisão ficar com o papai?".

É em nossa família que melhor vivemos a experiência do amor, da causa para a luta, da motivação para o dia seguinte. E a distância, as viagens, ao menos têm a vantagem de mostrar que há um lugar à nossa espera, que podemos chamar de lar, que abriga não apenas pessoas amadas, mas sonhos vividos, histórias contadas, emoções sentidas. A distância, enfim, faz querer a proximidade.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Música do fim de semana: Captivated (Lady Gaga)

Lady Gaga faz hoje o maior sucesso, sobretudo pela figura espalhafatosa que criou, com um estilo diferente de se vestir e se apresentar. Lembra um pouco a Madonna do passado, com seu jeito transgressor que lhe valeu muita polêmica e sucesso. Mas Lady Gaga tem músicas bonitas, com letras interessantes, com dose de romantismo. Uma das músicas mais bonitas dela é "Captivated" (Fascinada), quando ela ainda cantava com o seu nome verdadeiro (Stefani Germanotta) e com cabelos escuros.

Como muitos fizeram o download da música, optei por mudar esse post e publicar aqui as músicas que mais gosto da Lady Gaga, numa playlist bem legal da cantora:

Censura: o STF endossou

A censura à imprensa prevaleceu no julgamento do Supremo Tribunal Federal na reclamação proposta pelo jornal Estado de S. Paulo contra o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que havia proibido a publicação de matérias sobre a operação da Polícia Federal que investigou Fernando Sarney, filho do presidente do Senado e ex-presidente da República, Sen. José Sarney. Na verdade, a maioria dos que votaram optou pelo argumento de não caber, naquele caso, o manejo da reclamação (petição aqui), deixando de decidir sobre o mérito, embora alguns membros que formaram a maioria tivessem beliscado o nervo da discussão.

Em editorial (aqui), a Folha de S. Paulo foi crítica à decisão, chamando pelo nome o significado da decisão do TJDF, de resto mantida intocada pelo STF: censura. Nome, aliás, que o Min. Celso de Mello, em seu voto contundente, não deixou de aplicar sem rebuços, com ênfase tamanha que incomodou os Mins. Eros Grau e Dias Toffoli, que se apressaram em afirmar que concordavam com as críticas feitas pelo decano, porém negavam-se a avançar para o mérito do remédio jurídico, que reafirmaram incabível para aquele caso.

O Min. Peluso (voto aqui) negou-se a admitir que o STF tivesse, ao declarar a inconstitucionalidade da lei de imprensa, de antemão estabelecido a liberdade de imprensa como um valor acima dos direitos da personalidade, honra e imagem, asseverando que "Não se lhe pode inferir, sequer a título de motivo determinante, uma posição vigorosa e unívoca da Corte que implique, em algum sentido, juízo decisório de impossibilidade absoluta de proteção de direitos da personalidade — tais como intimidade, honra e imagem — por parte do Poder Judiciário, em caso de contraste teórico com a liberdade de imprensa".

Nada obstante essas ponderações, o certo é que não se tratavam as notícias do Estadão de questões pessoais ou familiares, tampouco de temas privados, mas sim do uso das relações políticas da família Sarney para supostamente obter vantagens para si ou terceiros, inclusive com imbrincações na crise do Senado e na ocupação de cargos no Ministério das Minas e Energia. Temas, portanto, de acentuado e legítimo interesse público. Existissem excessos praticados pelo Estadão, haveria a possibilidade de manejo de ações compensatórias, inclusive com ressarciomento por eventuais excessos praticados pelo órgão de imprensa.

A censura, seja ela de iniciativa de que Poder for, inclusive do Judiciário, é um perigoso caminho tomado em contradição com a democracia, cuja liberdade de expressão e informação é a sua pedra angular. Por isso mesmo, não pode ser endossado o argumento pouco sólido do Min. Eros Grau, que buscou na lei a linha divisória entre censura e "aplicação dos limites da lei". Aquela seria própria ao regime de força; essa, aos regimes democráticos. Olvidou, porém, que a censura no Brasil iniciou de forma extrema justamente com a edição de um ato ponente de normas, o AI-5. Não é o instrumento legal que define o que seja ou não censura, mas o seu conteúdo, seja ele ejetor de normas gerais ou individuais. É a poda da liberdade de expressão, é o limite a liberdade de informação, enfim, que qualifica a existência ou não de censura. O resto, convenhamos, é retórica justificadora. E só.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Ciência do direito

Perguntou-me André Morgan: Parabéns pelo seu pensamento científico exposto já nas primeiras linhas. Sua defesa ao pensamento potesiano é realmente fiel. Fico alegre quando vejo um jurista revelar o direito de forma correta, desfazendo, assim, a enorme confusão que outros autores fazem.

Gostaria, se possível, fazer algumas indagações ao prof:

a) O direito como fenômeno, existe antes do homem ?
b)É possivel realizar uma distinção entre aquele e o direito como dado cultural, portanto, posterior aquele?
c) É possível ao direito dar uma resposta certa para determinada relação jurídica, ou no direito é aceito várias respostas para uma só relação jurídica ?
d) Direito é ciência ? Ou estamos no campo da argumentação apenas ?

Respondo:

a) o direito é fenômeno cultural, portanto afeto ao homem em relação (o eu-tu do primeiro capítulo do livro). Pontes, homem do seu tempo, viu o fenômeno jurídico também das relações vegetais e inorgânicas, por excesso de biologia e física. Entenderemos o pensamento de Pontes no "Sistema..." se analisarmos a obra de Ihering, por exemplo, e outros pensadores presos ao positivismo do final do século XIX e da primeira quadra do século XX.

b) Só há direito onde há sociedade, onde o homem se põe diante de outro homem e a sua conduta precisa se pautar por normas cogentes de convivência.

c) contrafaticamente - a moda do juiz hércules de Dworkin - devemos trabalhar com uma resposta certa, embora haja uma arco de possíveis respostas corretas, superadas por um processo racional de otimização. André, o plano da incidência é uma instância não-empirica, contrafática, como a norma fundamental de Kelsen. Impõe ao aplicador uma vinculação teorética de buscar sempre a melhor resposta (que não significa a única resposta, senão metodicamente). A vantagem do pensamento pontesiano está justamente em fechar as portas para o ceticismo hermenêutico ou para o divórcio entre texto e significado. O plano da incidência é justamente o mundo do pensamento, a certeza que o aplicador tem de que o ordenamento jurídico não é criação sua, subjetiva, mas que é um algo que está aí (fenômeno que denominei de "istidade"), apropriado por todos e cada um, de modo que diante de uma relação jurídica, de um ato jurídico, de uma norma jurídica, o aplicador busca sempre a conformação entre norma e fato dentro do diálogo intersubjetivo no qual estamos sempre inseridos.

d) Direito é ciência, não é apenas prudência. Há a ciência jurídica (sobrelinguagem) e o direito (linguagem objeto). A argumentação faz parte do processo da linguagem objeto, mas não exaure a sobrelinguagem. Toda ciência, empírica ou não, padece das mesmas dificuldades e limites ínsitos à linguagem. A ciência do direito, como a ciência da matemática, busca conhecer, explicar e em certa medida construir o objeto estudado. Antes de Einstein não se podia pensar, como objeto de estudo, a física quântica. As susa fórmulas, em certo sentido, criaram um objeto que ali já estava, sem a interpretação da linguagem. O mesmo ocorre com o Direito. A linguagem cria e estuda o que ali já estava, antes dela, porém sem as marcas do humano, sem ingressar nas relações intersubjetivas. Eis aí o sentido do mundo 3 de Popper.

As suas perguntas não são simples de responder. Mereceriam um livro. No fundo no fundo, o meu livro cuida delas.

domingo, 6 de dezembro de 2009

sábado, 5 de dezembro de 2009

Jejum, suor e fé...

Tudo bem, estamos todos ansiosos. Tentei comprar ingressos para o Maracanã, mas não deu. Mesmo que tivesse comprado - descobri depois - seria impossível ir, porque compromissos da segunda-feira me impediriam.

Amanhã é dia de torcer, sofrer e... - quem sabe, afinal?! - comemorar, com um grito preso na garganta há 17 anos. Eu lembro do Júnior correndo como um menino quando o Flamengo foi campeão, ele o grande herói daquele time de 1992.

Na espectativa, deixo aqui uma série de músicas para ir preparando o nosso espírito para amanhã. Poxa, seria muito bom quebrar esse jejum (enquanto outros não são quebrados...), em um dia que promete muito, com suor, cerveja e muita fé.

Música do fim de semana: Maria Rita

Um bom pagode para o fim de semana, que promete muito. Pode ser o fim do jejum...