sexta-feira, 13 de abril de 2012

Gente e bichos: somos águia, galinha e borboleta!

Um animal que sempre está associado ao combate é a águia. É uma ave predadora, cujo olhar intimida. Não é à-toa que virou um dos símbolos de força dos americanos. Mas a águia tem uma história interessante como espécie. Quem nos conta é Renato Bilher:


"A águia é a ave que possui maior longevidade da espécie, chega a viver setenta anos. Mas para chegar a essa idade, aos quarenta anos ela tem que to mar uma séria e difícil decisão. Aos quarenta ela está com as unhas compridas e flexíveis, não consegue mais agarrar suas presas das quais se alimenta. O bico alongado e pontiagudo se curva. Apontando contra o peito estão as asas, envelhecidas e pesadas em função da grossura das penas, e voar já é tão difícil!

Então a águia só tem duas alternativas: Morrer, ou enfrentar um dolorido processo de renovação que irá durar cento e cinquenta dias. Esse processo consiste em voar para o alto de uma montanha e se recolher em um ninho próximo a um paredão onde ela não necessite voar. Então, após encontrar esse lugar, a águia começa a bater com o bico em uma parede até conseguir arrancá-lo.
Após arrancá-lo, espera nascer um novo bico, com o qual vai depois arrancar suas unhas. Quando as novas unhas começam a nascer, ela passa a arrancar as velhas penas. E só cinco meses depois sai o formoso vôo de renovação e para viver então mais trinta anos.

Em nossa vida, muitas vezes, temos de nos resguardar por algum tempo e começar um processo de renovação. Para que continuemos a voar um voo de vitória, devemos nos desprender de lembranças, costumes, velhos hábitos que nos causam dor.
Somente livres do peso do passado, poderemos aproveitar o resultado valioso que a renovação sempre nos traz."


Aqui, como vimos, há uma outra característica da águia: a sua longevidade, porém dependente do sacrifício que esteja disposta a suportar. O sacrifício termina sendo, também para nós, um elemento de longevidade profissional ou pessoal. Ninguém vence na vida sem abdicar dos bicos e das unhas sem pegada; ninguém vence sem uma cota de dor, de perdas, de suor, lágrimas e muita determinação.


Ainda sobre a águia há uma interessante metáfora de James Aggrey, adaptada por Leonardo Boff, que nos ajuda também a refletir sobre o sentido da vida, a nossa vocação e os desafios assumidos.

 
"A ÁGUIA E A GALINHA: Uma metáfora da condição humana



Era uma vez um camponês que foi a floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Coloco-o no galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração própria para galinhas. Embora a águia fosse o rei/rainha de todos os pássaros. Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:

- Esse pássaro aí não é galinha. É uma águia.
- De fato – disse o camponês. É águia. Mas eu criei como galinha.
Ela não é mas uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase três metros de extensão.
- Não – retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.
- Não, não – insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.

Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:

- Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não a terra, então abra suas asas e voe!

A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas. O camponês comentou:
- Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
- Não! – tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia! E uma águia será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.

No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurrou-lhe:

- Águia, já que você é uma águia, abra as suas asas e voe!

Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas, ciscando o chão, pulou e foi para junto delas. O camponês sorriu e voltou à carga:

- Eu lhe havia dito, ela virou galinha!
- Não! – respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma ultima vez. Amanhã a farei voar.

No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha. O sol nascente dourava os picos das montanhas. O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:

- Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra suas asas e voe!

A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse nova vida. Mas não voou. Então o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.

Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou com o típico kau-kau das águias e ergue-se, soberana, sobre se mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a voar cada vez mais para o alto. Voou... voou... até confundir-se com o azul do firmamento...

E Aggrey terminou conclamando:

- Irmãos e irmãs, meus compatriotas! Nós fomos criados à imagem e semelhança de Deus! Mas houve pessoas que nos fizeram pensar como galinhas. E muitos de nós ainda acham que somos efetivamente galinhas. Mas nós somos águias. Por isso, companheiros e companheiras, abramos as asas e voemos . Voemos como as águias. Jamais nos contentemos com os grãos que nos jogarem aos pés para ciscar".

Um animal que, ao contrário, está associado à delicadeza é a borboleta. Leio na Wikipédia que "o termo grego 'psyche' tinha dois significados originalmente. Um deles era alma e o outro, borboleta, que simbolizava o espírito imortal. Na mitologia grega, a personificação da alma é representada por uma mulher com asas de borboleta. Segundo as crenças gregas populares, quando alguém morria, o espírito saia do corpo com uma forma de borboleta".

A borboleta revela, penso eu, a fragilidade: uma beleza sem par, com cores vibrantes ou não, ela parece não ter defesas, mesmo quando ainda lagarta. Mesmo assim, nessa fase, como muito para guardar energia e se enclausurar. É como se fosse para dar um tempo, refletir, refazer-se, para só então se transformar, dando um salto para a liberdade. O casulo se rompe para abrir o mundo para a borboleta. Frágil, sim, mas com coragem suficiente para voar, para polinizar o mundo. A fragilidade e a beleza são suas características conaturais, mas ser frágil não implica ausência de atitude, de coragem de voar para cumprir o seu papel, para viver a sua vocação, para autorrealizar-se como ser-no-mundo, na temporalidade.

Atitude. Sem desculpas ou sem despedir-se das suas responsabilidades para afetá-la a outros. A borboleta não se esconde em sua fragilidade, porque - se o fizesse - não sairia do casulo, não deixaria nunca de ser pupa, escondida dentro da crisálida.

Na natureza, não importa se o animal é forte, como a águia, ou frágil, como a borboleta. O que realmente importa, no ciclo da vida, é se vive a sua vocação, é se faz a sua parte sem esperar que alguém faça por si, como uma eterna justificativa para não ser plenamente realizado no papel que a natureza lhe reservou.

Se temos um lado águia, voltados para os voos altos e os largos horizontes, temos que ter um lado galinha, para que não percamos de ter os pés no chão, a busca de terra firme aonde pousar. E, ainda, um lado borboleta, em que saibamos ter coragem de voar apesar dos nossos medos, das nossas fragilidades.

ÁGUIA = vontade de voar e sonhar alto;
GALINHA = pés nos chão, com a realidade diante dos olhos;
BORBOLETA = coragem para realizar os sonhos de voar, mesmo com as suas fragilidades.

Eis aí três facetas de uma mesma realidade complexa que somos nós. A atitude, os gestos, eles são nossos, quando queremos lutar pelo que vale a pena na realização da nossa vocação, dos nossos sonhos. Temos sempre que fazer a nossa parte!




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